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Vaca Amarela (Um Lugar Silencioso – 2018)

Este texto também pode ser lido no Sete Cultura.

Lee pede para a filha ficar parada

O gênero horror é um dos mais complexos em narrativas. Com a limitação de ser sempre sobre algo que persegue ou ameaça vítimas, é difícil criar algo novo em qualquer filme que aparece. Talvez seja por isso que este Um Lugar Silencioso tenha chamado tanto a atenção do público e da crítica. Há algo de novo que influencia na construção sonora.

Quem não souber nada sobre a trama, vai estranhar o silêncio que domina a rotina da família Abbott nos minutos iniciais. Mas é onde reside grande parte do brilhantismo do roteiro do trio Bryan Woods, Scott Beck e do também diretor da produção, John Krasinski. A trama se revela através dos acontecimentos.

Então é preciso esperar que um dos filhos acidentalmente faça um barulho para que o espectador compreenda o que é que tornou o mundo um lugar devastado. Por sorte, Regan (Millicents Simmonds), a filha mais velha, é surda-muda. Com isso, todos os Abbott sabem se comunicar com linguagem de sinal.

conversa em linguagem de sinais na mesa de jantar
Família vive com linguagem de sinais no pós-apocalipse.

E a produção, assim como o espectador, mergulha no mundo sem ruídos da família. Mas a mãe, Evelyn (Emily Blunt), está grávida e o pai, Lee (Krasinski de novo) precisa arrumar uma forma de terem um parto seguro ao mesmo tempo em que os filhos já crescidos têm que aprender a se cuidar nessas condições de vida tão perigosas.

Assim como o roteiro é minimalista ao se focar em apenas dois dias de história, a direção se preocupa em fazer um trabalho cuidadoso de ambientação. Principalmente por parte da excelente captura e mixagem de som.

Como há pouco áudio, é possível ouvir quase todos os detalhes, como passos, grãos de areia, movimentos de portas ou tecidos sendo dobrados. Quando algum barulho mais alto acontece e atrai o perigo, o mixador Michael Barosky faz com que o volume se eleve mais que o normal, para realmente alarmar o espectador. Só nesses momentos a composição pobre de Marco Beltrami aumenta, o que ainda a torna eficiente.

Emily segura o grito em close
Tensão a todo custo. Tem que segurar o grito mesmo com dor.

Isso somado a um detalhismo de enquadramentos de Krasinski, serve muito à imersão. Ele não se limita a poucos planos. Muito pelo contrário, corta entre enquadramentos que revelam a proximidade dos perigos dos protagonistas. Assim, o espectador sempre sabe de algo que os personagens não sabem e se aflige por eles. O que cria uma tensão constante.

Por outro lado, ele repete o pecado comum de filmes de terror recentes e arruína toda a inquietude das cenas ao dar sustos fáceis e preguiçosos com sons altos. Em um dos momentos, as crianças são perseguidas, mas não sabem por onde. Quando o susto revela a posição do perigo, deixa de ser terror para virar ação sem suspense. Ainda mais quando o público já sabe qual a solução para a situação.

Até que o filme alcança o clímax emocional, em que o tema principal – os limites do que pais são capazes de fazer para proteger os filhos – tem uma conclusão. Depois, há uma cena a mais com sérios problemas de lógica. O terror perde a urgência porque Krasinski quer passar as conclusões a que Regan chega, mas tudo já havia sido revelado anteriormente na história.

Lee pede silêncio
Shh… Qualquer ruído mais alto causa tensão.

Ainda assim, quando uma cadeira caiu no restaurante após a sessão, não foi possível segurar a tensão de que os inimigos do filme pudessem aparecer na vida real. O que denota uma excelente ambientação que segue com quem assiste, mesmo depois que o filme termina. E isso é sempre um bom sinal para qualquer produção, especialmente para o horror.

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