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Tomb Raider: A Origem (Tomb Raider – 2018)

Este texto também pode ser lido no Sete Cultura.

Lara suja com uma picareta na mão

A icônica Lara Croft é uma personagem de história confusa. Criada em uma época em que estilo importava mais que conteúdo, ela recebeu inúmeras reinvenções através dos anos. A mais bem sucedida foi com o game Tomb Raider de 2013, que voltava para o início da vida adulta da heroína com doses pesadas de “realismo” condizente com os tempos atuais. Não é à toa que o jogo foi a base para a nova reinvenção da arqueóloga nos cinemas.

Assim como na versão digital, Lara (Alicia Vikander) navega rumo ao mar do diabo em busca de uma ilha japonesa e descobre um grupo de homens liderados por Mathias Vogel (Walton Goggins) que procura pelos poderes sobrenaturais da rainha Himiko, enterrada no local. Aqui, no entanto, ela quer encontrar o pai Richard (Dominic West) desaparecido há sete anos.

Premissa simples, mas cheia do material necessário para preencher a tela por duas horas com aventuras pulp tornadas populares com os filmes do Indiana Jones (a personagem foi criada com base no aventureiro). Os roteiristas Alastair Siddons e Geneva Robertson-Dworet se inspiram no jogo em diversos níveis. Desde detalhes como os nomes do barco, do vilão e da rainha japonesa, até a abordagem realista sobre a personalidade de Lara.

lara no filme e no game
Recriação do game chega a detalhes de figurino e de nomes de barcos.

O que carrega para a adaptação conceitos interessantes. Afinal, Lara foi criada como uma mulher sem personalidade além de ser uma mulher de roupas curtas e cheia de atitude que gosta de desenterrar tesouros para enfeitar a casa. O que levaria uma pessoa normal a sair por aí com armas contra empresas do mal para resgatar peças preciosas?

A resposta do jogo é: muitos traumas físicos, emocionais e mentais, além de uma dose cavalar de violência. Neste filme, porém, parece que os realizadores esqueceram da pergunta inicial. A Lara interpretada por Vikander é jogada no meio de uma corrida para um tesouro e não quer nada além de encontrar o pai. No fim do filme, ela decide abraçar a herança dele, o que a levará a outras aventuras futuras, caso a produção vá bem nas bilheterias.

Não há essa construção da personagem clássica, o que não é necessariamente um problema. Ainda há um desenvolvimento de Lara, mesmo que mais superficial. Os roteiristas aproveitam para tratar da vida da personagem antes da ilha com boas soluções. Ela pratica jiu-jitsu em uma academia e, no fim da aula, o professor pede para ela não voltar enquanto não fizer os pagamentos atrasados.

Croft pai e filha se despedem diante da casa
Lara criança com o pai. Motivações para buscar ilha perdida.

Assim, o espectador sabe das condições financeiras sem que alguém precise dizer algo estúpido como: “Lara, você sabe que não paga a academia há meses.” Se ela sabe, por que ele diria, certo? É expositivo sem tratar o espectador com um idiota. Por outro lado, logo em seguida, ela se mete em uma corrida arriscada e ilegal para receber dinheiro. Ela aceita tudo com um sorriso debochado no rosto para que a sequência de ação em seguida seja conduzida por um tema de rock genérico. É tão forçado na forma de fazer com que ela seja divertida com o estilo maneiro que é ingênuo e falso.

Pequenos problemas do tipo se repetem em cenas de ação estranhas, nas quais parece que o diretor Roar Uthaug esqueceu de filmar um ou outro enquadramento importantíssimo para criar noção espacial para o espectador. Em certo ponto, Lara se esconde de um assassino em uma tumba. De repente a câmera treme, a personagem grita e tudo fica impossível de compreender. Apenas quando a ação acabou que a cena muda para um ângulo afastado que esclarece o que aconteceu.

No centro disso tudo estão Vikander e Goggins, que carregam a produção nas costas com um vigor que os realizadores não merecem. Mesmo com a ingenuidade da escrita de Lara, a atriz empresta para ela parte do carisma natural com sorrisos genuínos e gritos de terror que parecem reais. Já Goggins pega uma meia explicação da motivação do vilão e carrega ela de humanidade. Apesar da maldade, é possível entender por que Vogel quer encontrar a tumba de Himiko tão desesperadamente.

Lara com Mathias em barraca
Vikander com Goggins em cena. Dupla é a melhor coisa do filme.

Com conceitos interessantes e até uma montagem de bom ritmo, o novo filme é o melhor da franquia Tomb Raider. Infelizmente, isso não quer dizer muita coisa. A protagonista (tanto personagem quanto atriz) merecia um tratamento mais rico por parte dos realizadores. Quem sabe numa possível continuação?

1 comentário em “Tomb Raider: A Origem (Tomb Raider – 2018)

  1. Critica maravilhosa. Tirou as palavras da minha boca, assim como comentei com os amigos que assistiram comigo. O filme ganha muito por causa da atriz de extrema competência, e da boa montagem, mas é essencialmente mal filmado. O editor pegou um material bem mais ou menos e fez um filme ok. Os efeitos especiais de quinta também não ajudaram.
    Não apostaria minhas fichas em uma continuação, a não ser que o estúdio tenha um interesse particular pelo projeto.
    Bjux!

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