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Os Esquecidos

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O cinema de Buñuel é feito de reflexões acerca da sociedade e de comportamentos. Nos seus filmes puramente surrealistas ele o faz através da subversão de valores. Em uma ficção com uma história mais linear como no caso deste Os Esquecidos, ele assume um tom panfletário para expor as consequências diretas das disparidades sociais.

Jaibo, um menor de idade, foge da prisão para retornar à liderança do bando de crianças do qual faz parte. De longe o mais velho do grupo, ele resolve buscar vingança contra Julian, outro menino mais velho que largou o crime e arrumou um emprego. Ele recruta um dos mais novos, Pedro, e o leva para ajudar. O confronto vai desencadear uma série de choques nas vidas de todos os garotos da quadrilha.

olvidados-1950-08-gJaibo, Julian e Pedro. Pilares da trama e da sociedade.

Logo de cara, fica óbvio o peso da temática. Menores delinquentes evocam uma das imagens mais feias das divisões sociais. Os meninos rumaram nessa vida por diversos motivos. Praticamente todos eles são abandonados pelos adultos em algum nível. Alguns não conhecem os pais, outros conhecem mas são tratados como lixo e um deles chega a ser “esquecido” pelo responsável na rua.
À princípio os meninos parecem malvados por natureza. Os vemos se reunindo e planejando roubar um idoso cego porque é fácil. Quando um deles sugere que quer estudar ou trabalhar, os outros o chamam de idiota. Parece que ser um bandido é ser legal. E Jaibo é o maioral não apenas por ser o líder e o mais velho, mas também por ter fugido da prisão.
Em meio a tanta malícia para conseguir sobreviver no dia a dia, eles são muito ingênuos. O que leva ao confronto de Jaibo com Julian. Sem nenhuma referência das consequências de sua própria violência, o criminoso acredita que está apenas machucando o outro. Mas qualquer pessoa com algum nível de conhecimento consegue prever o que vai ser do pobre Julian.
Quando Pedro percebe no que se envolveu, o convívio com Jaibo piora exponencialmente. O menino procura a mãe em busca de ajuda. Esta o recrimina por ser parte de uma gangue e se nega a alimentá-lo e ajudá-lo. Pouco a pouco Pedro parte para a solução que as poucas informações que tem indicam.

Los-olvidados-8Mãe distante. Pedro é ignorado na hora da refeição.

Os adultos são negligentes, cruéis, desinformados e culpados. Até os que parecem mais responsáveis, como o idoso cego, acabam sendo parte da parcela que explora os meninos e catalisam suas degenerações. Isso segue até o momento em que Buñuel apresenta uma voz solitária de bom senso. Um agente social que se predispõe a tirar Pedro das ruas e colocá-lo em algum caminho correto. Para deixar claro como o personagem funciona, ele entra em cena soltando a seguinte frase para a mãe do menino: “Às vezes eu acho que devíamos punir os pais e não as crianças”.
Nesse clima de exposição de problemas sociais, deve-se ter a noção de que não se trata de um filme tranquilo. Os temas e as situações são pesadíssimos. Quando o filme chega ao terceiro ato, a sensação de desespero é grande e o clímax focado no conflito entre duas crianças deixa muita obra atual de Hollywood no chinelo.
Buñuel fez o filme repleto de simbolismos. Seu estilo de surrealismo se revela muito com os pesadelos dos meninos, mas acima de tudo, na representação dos animais. Principalmente na figura das galinhas ao redor de Pedro. Elas representam a opressão dos adultos sobre ele. Ele as adora, mas aos poucos passa a descarregar nela seu ódio e elas, assim como os adultos, serão a causa de sua tragédia.
Porém, o filme trata o tema de uma forma tão pesada e chocante que chega ao limite de matar um animal em cena. Não é o animal mais defensável e é bem comum que as pessoas estejam acostumados em ver representantes daquela espécie morrendo. Mas foi a primeira vez pra mim e foi muito chocante. Principalmente porque eu não tinha ideia de que aconteceria. Eu sentei tranquilo, indo assistir um filme clássico de menos de uma hora e meia. A história já estava pesada, mas quando o pobre bichinho foi morto foi longe demais.
Não sou vegetariano nem nada do tipo, mas matar um animal para ter um enquadramento é algo que repudio. Não fosse essa cena, eu teria gostado muitíssimo do filme. Mas ela não só choca, como também distrai da discussão principal. Após assistí-lo, minha conversa com a namorada foi basicamente toda sobre aquele take e quase nada sobre as situações retratadas.
 
GERÔNIMOOOOOOOOOOO…

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