Postado em: Reviews

O Rei do Show (The Greatest Showman – 2017)

hugh jackman canta.jpg

Existe uma ironia quase cruel quando, em certo ponto deste O Rei do Show, um personagem descreve o circo montado por P. T. Barnum (Hugh Jackman) como uma celebração da humanidade. Porque é claro que o filme pretende fazer essa mesma comemoração com muita música e pompa no melhor estilo de musicais clássicos.

Porque é um erro contar a história de Barnum e do sócio Phillip Carlyle (Zac Efron) do ponto de vista do idealizador do show. Extremamente criativo e apaixonado pelo sentimento de entreter pessoas, ele teve, de repente, a ideia brilhante de formar um espetáculo com pessoas com deficiências, negras ou com características peculiares. O que na época era visto como aberração, virou fonte para as riquezas dos dois homens, que tinham muito talento para o negócio.

Realmente, o que eles conseguiram é admirável. Se o que o filme revela for verdade, é claro. Mas este filme já está mais de oitenta anos atrasado em relação ao clássico Monstros, de 1932, que acompanhava uma trupe de pessoas com deficiências enquanto enfrentavam vários preconceitos. Ao invés de focar em dois homens brancos e dar protagonismo particularmente para o que está preocupado com a família loira.

Ainda assim, o conflito dele é interessante. Depois de uma infância na pobreza e de se esforçar muito para ficar com a garota por quem é apaixonado desde criança, Barnum tenta garantir que as filhas jamais sofrerão o preconceito pela falta de status que ele sofreu. Tanto que não percebe que não precisa continuar em busca de dinheiro e fama, porque já tem uma família feliz.

trupe completa de aberrações
Trupe de “aberrações” comandada por Barnum.

Tudo isso embalado pelo que musicais clássicos têm de melhor. Direção de arte pomposa, com grandes cenários e roupas coloridas, belas e elegantes; Direção de fotografia elaborada, que precisa iluminar inúmeras camadas de figurantes, paredes e objetos; e, o mais importante, dezenas de dançarinos e cantores talentosos com números cheios de giro, saltos e canto dançante. Não fica atrás de nenhum Cantando na Chuva.

Ainda mais quando o diretor de primeira viagem Michael Gracey faz com que a câmera participe da coreografia junto com os atores. No melhor número do filme, o casal Carlyle e a trapezista Anne Wheeler (Zendaya) cantam sobre o amor deles, que é tornado impossível pela diferença de classe e de cor.

Gracey faz com que o número musical também seja um número de trapézio, com direito aos dois atores se balançando para um lado e para o outro enquanto cantam. A câmera sobe e desce com eles enquanto eles tentam ascender, descer e ir de um lado pro outro para poderem se tocar. A coreografia representa a vontade dos dois de ficar juntos e a dificuldade de conseguir o objetivo.

Infelizmente, os momentos musicais são feitos apenas para dançarinos habilidosos. E como três dos personagens mais importantes são uma mulher obesa, um homem com ananismo e outro extremamente alto, eles não podem dançar. Seria muito mais interessante ter números pensados especialmente para as características deles. Ao invés, colocam bailarinos com maquiagem para representar manchas de pele, ou com perucas brancas para que eles interpretem albinos.

zac e zendaya dançam com cordas
Zendaya e Efron no melhor número musical do filme.

O roteiro segue a estrutura padrão de cinco atos do cinema clássico, com um bom ritmo e diálogos bem escritos que não caem na super exposição porque a dupla Jenny Bicks e Bill Condon sabem usar os momentos musicais para contar a história, ao invés de ser espetáculo vazio. Por outro lado, criam muitas histórias paralelas que apenas fazem com que o filme seja mais longo do que precisa ser sem que todas elas se desenvolvam completamente. Principalmente o romance de Carlyle e Wheeler. Eles nunca parecem se amar de verdade e a história dos dois não tem conclusão.

O elenco dá um show. A começar por Jackman, que tem um alcance vocal impressionante e dança muitíssimo bem. Efron virou um ator muito superior ao início de High School Musical, mas ainda tem alguns momentos de tristeza que mais parecem devaneio. Zendaya varia bem entre os momentos de tristeza e rejeição, mas não tem muito o que fazer.

Bons atores, com bons personagens em uma produção bem feita. O Rei do Show é um bom exemplo de como o conteúdo é importante além da parte técnica. Apesar da bela mensagem, ele parece esquecer qual é o foco correto ao dar destaque para a família branca. Ainda é um grande espetáculo musical que já se faz relevante ao tentar ser como se descreve: uma celebração da humanidade.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.