Postado em: Reviews

O Pequeno Príncipe (Le Petit Prince – 2015)

raposa de pelúcia entre livros.jpeg

O Pequeno Príncipe é um daqueles clássicos infantis obrigatórios. O grande problema com esse status é que ele cria uma preguiça e um temor natural. E se eu não gostar desse negócio que é quase uma lei ser bom? E se for algo chato por ser antigo? O livro, felizmente, não se adequa a nenhuma dessas dúvidas. Mas elas valem muito para uma adaptação da obra.

Como fazer com que o curtíssimo livro renda um filme de pelo menos 90 minutos? A solução aqui é fazer com que a história seja sobre uma personagem chamada apenas de A Menina (voz de Clara Poincaré), que tem toda a vida planejada pel’A Mãe (voz de Florence Foresti). Quando descobre que o vizinho, um idoso Aviador (voz de André Dussollier) escreveu em anotações o encontro com um príncipe menino (voz de Andrea Santamaria) em um planeta minúsculo, passa a rever conceitos e lições que aprendeu.

Basicamente, o filme é sobre uma criança que aprende as lições do livro O Pequeno Príncipe ao ler o livro e refletir sobre como ele afeta diretamente a vida dela. Assim como o material original, o tema principal é a finitude e os valores de tudo o que existe uma vez que tudo terá de acabar.

Dessas questões surgiram frases icônicas que se tornaram talvez até mais famosas que o livro, como “Você é responsável por tudo o que cativas” ou “O essencial é invisível aos olhos”. Pelas citações fica claro uma riqueza literária com um valor especial por se comunicar tanto com adultos quanto com crianças. É o grande trunfo de O Pequeno Príncipe. O livro é sobre um menino fictício e alienígena que reflete sobre as idiossincrasias humanas com o olhar único de uma pessoa plenamente inocente.

menina-com-velho
A Menina e O Aviador. Relação que faz ponderar sobre a vida.

Para as crianças funciona porque a vida adulta é incompreensível para elas. Para os adultos, porque eles reconhecem as incoerências da obrigações da vida deles, e conseguem rir delas ao mesmo tempo em que refletem sobre as mudanças necessárias. Para isso, o filme abre mão da fantasia pueril inicial do livro para ser verossímil com a Menina e a Mãe. Aos poucos, à medida em que a protagonista descobre o mundo do livro, a produção se torna mais ingênua.

O recurso funciona devido ao fato de que dialoga de forma mais clara com as crianças (em especial as francesas) atuais. Ainda faz algo que o livro não proporciona. Ao fazer com que A Menina e O Aviador dialoguem sobre as reflexões da trama, o filme aborda os conceitos mais profundamente e os torna mais claros para os espectadores.

No terceiro ato, justamente onde se cria além do material do livro, se encontra o grande problema da adaptação. Com aproximadamente 30 minutos para que o filme termine, A Menina parte em uma jornada pessoal que carrega intervenções no original problemáticas. Primeiro porque muda muitas das personalidades e valores de alguns dos personagens clássicos do livro: principalmente do Pequeno Príncipe.

pequenho-principe-e-a-rosa
Um príncipe que ama uma rosa. O simples e singelo parece absurdo só para adultos.

Depois porque usa conceitos maniqueístas. É preciso haver um vilão a ser derrotado em uma história na qual as lições originais não encaixam vilanias. O livro nunca abriu espaço para antagonizar os adultos ou a vida adulta, mas para sentir pena daqueles que esqueceram o que existe de valioso em ser criança. Felizmente a reflexão principal ofusca esses defeitos.

Há uma mistura de técnicas para a realização do filme. Todas as partes que A Menina testemunha e vive são feitas em animação digital, quando ela lê a história ou imagina algo, a técnica remete a stop-motion, com direito ao Pequeno Príncipe, os outros personagens e os objetos, parecerem feitos de madeira. Não apenas tem o valor narrativo de diferenciar enredos paralelos, como também reflete o visual das ilustrações do livro original.

Belo e rico justamente por se tratar de uma adaptação de um material belo e rico. Não possui a força total do livro, mas ainda faz um extraordinários trabalho de dialogar com crianças atuais e, talvez, modernizar o texto. Em momentos parece preso demais à cultura francesa moderna, mas o principal não é comprometido.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.