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Jogo do Dinheiro (Money Monster – 2016)

Clooney e O'Connel tensos

Desde 2008, surgiu uma tendência interessante no cinema estadunidense. Em reflexo da crise financeira que tomou os Estados Unidos naquele ano, filmes de todos os gêneros passaram a tratar do assunto de diversos ângulos. O mercado de ações é complexo e Jogo do Dinheiro surge para tentar mostrar que os problemas de verdade se encontram nas pessoas.

Para isso, é contado o drama de Lee Gates (George Clooney), apresentador fictício de um programa sobre mercado financeiro, quando ele é feito refém por Kyle Budwell (Jack O’Connell), um homem que perdeu todo o dinheiro ao seguir uma dica dele de investimento na bolsa de valores. Junto com a produtora do estúdio, Patty Fenn (Julia Roberts), Lee tenta descobrir porque os valores do mercado deram errado para Kyle e salvar a vida de todos.

Sequestro com reféns é uma trama típica de suspenses. Em Jogo do Dinheiro serve a um propósito específico: mostrar os diversos níveis de problemas sociais que explicam como não é apenas o sequestrador o vilão da história. Já foi explorado muito bem em filmes como A Negociação, O Quarto Poder e Um Dia de Cão. Seria a Jodie Foster, diretora do filme, tão eficiente quanto um F. Gary Gray, um Costa-Gravas ou um Sidney Lumet?

Julia Robert produtora de TV
Roberts como produtora de TV. Eficiência não adianta sem profundidade.

A resposta é sim e não. Foster dirige suspense com maestria e conduz um ritmo alucinante durante a duração de Jogo do Dinheiro. Ela cria expectativas através das cenas para, no fim delas, invertê-las e pegar o espectador de surpresa. No que é, provavelmente, a melhor cena do filme, Gates faz uma aposta junto de Kyle. Coloca a própria vida em jogo para tentar criar especulação no mercado de ações e profere um discurso engrandecedor. Os enquadramentos passam a retratar o personagem de baixo para cima, para que ele cresça na tela. Os figurantes que assistem ao drama ao vivo recebem closes e parecem emocionados. A trilha cresce com o discurso. O resultado é um baque de realidade. A bolsa não se importa com vidas, apenas com dinheiro.

Ao mesmo tempo, Foster não é capaz de perceber que as falas e a mensagem panfletárias do roteiro da trinca Jamie Linden, Alan DiFiore e Jim Kouf são caricaturais de tão forçadas. Depois de alguns minutos na mira de Kyle, Patty grita para uma representante de uma empresa “Você tá contando mais mentiras institucionais”. Esta fala é de uma personagem que trabalhou por anos em um programa de investimento e, supostamente, compreende o mercado. A ingenuidade de acreditar que alguém com este nível de conhecimento diria algo tão tolo ressoa em todo o filme.

É difícil acreditar que veteranos politizados da indústria de entretenimento como Jodie Foster, Julia Roberts e George Clooney leram o roteiro e realmente acreditaram que o discurso é coerente. Não leva muito tempo de projeção para que Patty e Gates estejam do lado de Kyle e queiram justiça por parte de um executivo. O filme literalmente assume que Kyle não tem culpa por ter pego uma arma e ameaçado a vida de dezenas de pessoas. Isso é justificado porque o mercado imobiliário é maligno e auxilia os ricos a ficarem mais ricos. O cúmulo é quando Kyle atira em um dos personagens mais simpáticos do filme e o mesmo trata a situação como se não fosse nada demais.

Clooney dança rap
Clooney como personagem zombeteiro. Ótima entrega ao papel.

Esse nível de maniqueísmo incomoda até a última cena do filme. Quando se descobre a conspiração que fez com que Kyle perdesse todo o dinheiro que tinha, o vilão é praticamente um psicopata. Como se a revelação do que ele fez não o tornasse mal o bastante, Foster e os roteiristas revelam pequenos detalhes desnecessários para que ele seja ainda mais malvado. Então, uma ridicularização quase infantil dele aparece para ser uma forma de justiça.

Clooney se entrega para o papel. Aplica toda a simpatia que possui no apresentador autodestrutivo e envolve. Quando Gates se apieda ao descobrir as tragédias pessoais de Kyle, é possível ver no olhar de tristeza de Clooney que ele sabe o que é estar naquelas situações. Julia Roberts faz uma produtora de TV experiente. A personagem não tem profundidade para a atriz desenvolver em cima. Jack O’Connell está ótimo como Kyle. A forma como anda com os ombros encurvados e olha sem compreender o que acontece ao redor demonstram as origens do personagem. Mas, mais uma vez, não há como se aprofundar. Kyle é só um coitado, sem nada de bom na vida.

O que poderia ser um suspense inteligente sobre questões sérias e importantes, se torna um grito político tão alto que não compreende a própria incoerência. Um desperdício dos talentos dos envolvidos em um roteiro tão fraco. É melhor procurar por Gary Gray, Costa-Gravas e Lumet.

 

fantastic..?

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