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O Amor é Estranho

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Remake do longa A Cruz dos Anos, de 1937, O Amor é Estranho faz algo muito original dentro do mercado de filmes que falam sobre relacionamentos românticos. Mesmo ao tratar de personagens gays, a trama não é sobre a homossexualidade. A produção de Ira Sachs revela uma honestidade que falta no cinema comercial.

Ben Hull (John Lithgow) e George Garea (Alfred Molina) oficializam a relação de 39 anos com um casamento pequeno. George dá aulas de música em uma escola católica há 12 anos e é demitido por conta do matrimônio. A perda da renda somada aos gastos na lua de mel e no apartamento que dividem os força a voltar a morar com familiares enquanto não conseguem uma nova morada.

O filme trata, de forma bem direta, sobre a inadequação de idosos na sociedade moderna. O que acontece quando a pessoa chega a um ponto em que precisa da ajuda de mais novos para sobreviver. Se vivem em casal, possuem a companhia um do outro. Mas quando não podem sequer contar com isso, se tornam fardos para parentes ou, pior, são isolados em casas de tratamento e esquecidos.

O Amor é Estranho é uma obra de momentos comuns. Alguns mais tensos, outros mais climáticos, mas todos rotineiros. Grande parte da qualidade do filme se encontra em como constrói isso em detalhes. Não é apenas a vida diária de Ben e George que precisa ser especificada, mas as dos parentes também. O sobrinho, a esposa e o filho adolescente de Ben possuem personalidades extremamente detalhadas. E os conflitos regulares dos três escalam com a chegada do parente que passa a viver o dia inteiro na casa.

lithgowBen tenta praticar arte e incomoda o filho do sobrinho.

Fica ainda mais complicado porque Ben tem problema cardíaco, ocupa espaço, demora a terminar de comer, gosta de conversar mesmo sem conseguir lembrar de todos os detalhes do que pretende discutir e passa a ser uma dificuldade especial para a esposa do sobrinho (vivida pela Marisa Tomei) e para o filho.

Não demora para ficar óbvio nos silêncios desconfortáveis que as pequenas peculiaridades das pessoas incomodam umas às outras. Quando Ben presencia uma briga dos pais com o filho, precisa ficar quieto porque a briga familiar não é da conta dele. Ainda assim, ele tem opiniões contrárias às de todos os envolvidos.

A forma como o filme se baseia nas conversas para contar a história é original. Poucos dos eventos que fazem a história seguir adiante são mostrados, mas comentados entre os personagens. A casa é vendida, mas o espectador sabe por conta de um diálogo entre George e o vendedor da imobiliária. Os dois reúnem os parentes para discutir com quem vão viver e a conversa explica como foi o processo de procura de opções e de emprego. Normalmente este recurso seria reprovável, se não estivesse focado em reforçar as relações entre as pessoas. Eles expõem informações básicas, mas muito do que é preciso entender fica escondido no que escolhem não dizer.

LOVE IS STRANGEGeorge discute com possível vendedor de uma nova casa.

O diretor Ira Sachs filma com sutileza, para dar destaque nas interpretações dos atores. Ele sabe mexer o enquadramento para tirar alguém importante em uma conversa da cena. O assunto muda e o foco de personagem também. Uma pequena movimentação da câmera coloca os atores certos no enquadramento.

John Lithgow e Alfred Molina dão a alma para o filme. Singelos e sensíveis, não precisam ser estereótipos para que interpretem gays. É de suma importância colocar dois grandes atores para os protagonistas. A forma como os dois realmente parecem se amar expressa em pequenos gestos e olhares é tocante. Eles ofuscam qualquer participação no filme, mesmo a de uma grande atriz como a Marisa Tomei.

Um ótimo exemplo do que acontece quando se mistura a trinca mágica de cinema. Um ótimo texto, interpretado por atores brilhantes e dirigido por um bom diretor. O resultado é uma pequena joia que passou quase desapercebida pelo circuito comercial. Felizmente, a crítica especializada e o público de filmes do estilo soube reconhecer o valor da produção.

 

GERÔNIMOOOOO…

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